INTRODUÇÃO
O percurso histórico da Igreja em Moçambique conheceu
momentos de cuja memória a história conserva até hoje. É esta odisséia que
tencionamos debulhar no presente trabalho. O nosso foco será a “Primeira
Guerra Mundial ao advento da Concordata” para desembocar no “Acordo e
Estatuto Missionários”. A Concordata, o Acordo e o Estatuto Missionários
são actos jurídicos que conferiram à Igreja mais liberdade na efetivação da
actividade missionária.
Não obstante as atrocidades que teve de atravessar a
Igreja moçambicana durante a “incursão” inesperada dos portugueses importa
realçar que a Igreja moçambicana, a pouco e pouco se vai autonomizando: com um clero
local e com um envolvimento assaz louvável dos fiéis leigos na causa do
Evangelho.
Depois de delinearmos o desenrolar da I Guerra Mundial,
causas e seu impacto em Moçambique, falaremos da celebração da Concordata e do
Acordo Missionário para terminar com a dissertação sobre o Estatuto
Missionário.
I. A PRIMEIRA
GUERRA MUNDIAL
1.1.
Antecedentes
A I guerra Mundial foi antecedida por um leque enorme
de causas que condicionaram a explosão desta batalha catastrófica de tamanho
mundial. “O jogo de interesses pela hegemonia européia e, portanto, mundial,
levou à criação de dois grupos de alianças: de um lado a Tríplice Aliança,
formada pela Alemanha, Áustria-Hungria e Itália; do outro lado, o Tríplice
Entendimento, que agrupava França, Rússia e Inglaterra” (RODRIGUES, 2000:54). Desta
situação resultava uma instabilidade do equilíbrio europeu, que qualquer
incidente poderia comprometer.
Nesta conjuntura
entra também, segundo Marime, «o problema da super produção e, com ele, o da
busca de mercados, o qual por sua vez, desencadeia a incessante procura de
matérias primas a preços concorrenciais. E, as alterações do mapa político
europeu (século XIX), na sequência do surgimento de novos Estados» (2011:71).
Detalhando, podemos aferir que, a partilha das terras da África e Ásia,
na segunda metade do século XIX, gerou muitos desentendimentos entre as nações
européias. Enquanto a Inglaterra e a França ficaram com grandes territórios com
muitos recursos para explorar, a Alemanha e a Itália tiveram que se contentar
com poucos territórios de baixo valor. Este ambiente perdurou até o início do
século XX e foi um dos motivos da guerra, pois os interessados queriam mais
territórios para explorar e aumentar seus recursos (cf. RODRIGUES, 2000:55).
Por outro lado, no fim do século XIX princípios do XX, as nações
européias passaram a investir sobremaneira no fabrico de armamentos. O aumento
das tensões gerava insegurança, fazendo assim que os investimentos militares
aumentassem diante de uma possibilidade de conflito armado na região. Outrossim,
a concorrência econômica entre os países europeus acirrou a disputa por mercados
consumidores e matérias-primas. Amiúde, acções economicamente desleais eram
tomadas por determinados países ou empresas com apoio do governo.
Enfim, a questão dos nacionalismos também esteve presente na Europa
pré-guerra. Além das rivalidades havia o pan-germanismo cujo ideal era a
formação de um grande império, unindo os países de origem germânica e o
pan-eslavismo, sentimento de cunho russo que envolvia também outros países de
origem eslava.
1.2.
Causas imediatas
Segundo os
mais estudos e análises históricas, os historiadores tendem a afirmar que as causas da Primeira Guerra Mundial são
extremamente complexas, tendo sido debatidas desde 1914, quando do início da
mesma.
A causa
imediata apontada é o assassinato, em Sarajevo (Bósnia), do Arquiduque
Francisco Fernando, príncipe-herdeiro da Áustria e sua mulher pelo sérvio
nacionalista G. Pzinzip, em 26 de Junho de 1914. A Áustria tomando isto como
pretexto decidiu realizar uma acção punitiva contra Sérvia e declara guerra à
Sérvia a 28 de Junho do mesmo ano e ataca no dia seguinte.
1.3.
O conflito
A guerra desenvolveu-se durante quatro anos e em quatro frentes: do
Próximo Oriente, nas colônias africanas e asiáticas e nos diversos oceanos e
mares.
Começada em 1914, esta guerra só virá a confirmar suas tendências de
universalidade no ano de 1915. Tanto um bloco como outro envidaram os seus
esforços no sentido de obter novas alianças. A Itália, depois de várias
conversações fracassadas com a Áustria, assina com os Aliados o Pacto de
Londres a 26 de Abril de 1915 e entra na guerra a seu lado. No domínio militar
a ofensiva não consegue vencer posições defensivas e a guerra transforma-se em
“guerra de desgaste” porque os dois grupos beligerantes não levaram a cabo
operações de grande envergadura.
A guerra veio a culminar no ano de 1918. A vitória que, finalmente, foi
alcançada neste ano, deveu-se mais ao desgaste das forças alemãs do que às
batalhas ganhas pelos Aliados, que no campo militar, iniciaram sem dificuldades
o novo ano. Depois do armistício com a Rússia, a Alemanha iniciou as
negociações para a paz, em que tentou incluir os restantes países aliados.
1.4.
Consequências
A paz de Paris incluiu uma série de tratados (1919-1923) entre os
Aliados e os países derrotados, sendo o principal o de Versalhes (28 de Junho
de 1919). Estes, sem excepção, sofreram perdas territoriais. A Alemanha ficou
sem as colónias e teve de ceder territórios a boa parte de países vizinhos.
Findou a monarquia dos Habsburgo com a desagregação do Império Austro-Húngaro.
Além das perdas territoriais, os países derrotados ficaram desarmados e, à
excepção da Áustria, onerados com pesadíssimas reparações da guerra. Não
somente não foram extintos os focos que levaram ao grande conflito armado, mas
outros ainda se deixaram em gestação. “As boas intenções que presidiram à
criação da Sociedade das Nações não obstaram a que se fossem desenvolvendo os
elementos que desencadearam a II Guerra Mundial” (RODRIGUES, 2000:70).
Segundo Marime, “em África, desta guerra resultou a redistribuição das
colónias à custa da derrota alemã, em consequência de que a Inglaterra e a
França ocuparam os Camarões e o Togo que, em 1920, repartiram formalmente entre
si; a Inglaterra ficaria ainda com a Tanganhica. A Bélgica ocuparia o Ruanda e
o Burundi, constituindo a África Oriental belga. A união Sul-Africana ocuparia
o Sudoeste Africano” (2011:73).
1.5.
O impacto da I Guerra Mundial em Moçambique
Parece absurdo imaginar a I guerra mundial no
território moçambicano. Todavia, a “Pátria Amada” envolveu-se nesta guerra a
partir de 1916 por via da invasão ao território, da parte dos alemãs
estabelecidos no Tanganhica que, atravessando o Rovuma, invadiram os portugueses
em Negomano e em Mecula (cf. MARIME, 2011:73).
Face ao ataque alemão, os portugueses retaliaram-se e
expulsaram os missionários do Verbo Divino, que tinham chegado à substituição
dos jesuítas, e as Irmãs Espiritanas que vinham substituir as de São José de
Cluny. Muitas missões ficaram sem assistência e, por consequência da intimação,
os missionários portugueses não puderam regressar a Moçambique por insegurança
dos mares e carestia de vida.
A actividade missionária em Moçambique foi retomada a
8 de Março de 1919 pelo decreto 5239 emitido por Carlos Maia, Ministro português
das colónias. Este decreto reactou a actividade das ordens religiosas, sob o
nome de “Institutos referidos por
Convenções internacionais aceites por Portugal”.
Um tempo depois, registou-se a entrada massiva de
missões estrangeiras não católicas. Isto adensou a política portuguesa, pois
estas missões eram equiparadas às nacionais, isto é, às portuguesas. Contudo, a
partir de 1922, vários institutos religiosos começaram a chegar a Moçambique.
Entre eles podemos destacar: os padres Montfortinos, vindos da Niassalandia, na
jurisdição do vigário Apostólico de Chire e as Irmãs Franciscanas Hospitaleiras
portuguesas. Em 1924 chegaram as irmãs da Congregação do Precioso Sangue. No
ano seguinte era a vez dos religiosos do Instituto Missionário da Consolata
seguidos pelas irmãs da Consolata em 1928. Em 1935, vieram as irmãs
Franciscanas de Calais (Irmãs Franciscanas Missionárias de nossa Senhora). Em
1937 chegaram os padres da Sociedade Missionária Portuguesa.
Este espírito de abertura às actividades missionárias,
foi acrescido por novas iniciativas de
formação do Clero indígena com a finalidade de garantir o futuro da Igreja em
Moçambique. Com efeito, foram enviados para a formação em Portugal alguns
candidatos dos quais em 1936 foi ordenado um frade franciscano Andre António
Firmino Fernandes. Podemos destacar ainda a abertura, em 1934, na Missão de
Amatongas de um Seminário eclesiástico para a formação do clero diocesano para
a prelazia de Moçambique. Deste Seminário, saiu “em 1953, o primeiro sacerdote
moçambicano do século XX: Frei Alexandre José Maria dos Santos”(MARIME,
2011:78) da Ordem dos Frades Menores.
II.
A CELEBRAÇÃO DA CONCORDATA
2.1.
Antecedentes próximos da celebração da Concordata
A celebração da Concordata teve, como precedentes,
enormes factores entre os quais: a anarquia política no inicio da era
Republicana portuguesa; o golpe de 28 de Maio à ditadura e ao fascismo e a
estabilidade política e socioeconómica subsequente.
De forma sumária, importa salientar que “os revolucionários
que entraram a governar Portugal após o derrube da monarquia por via da proclamação
da República a 5 de Outubro de 1910, ao mesmo tempo que combatiam a Igreja, digladiavam-se
entre si e acabaram arrastando pelas ruas da amargura o funcionamento das
instituições do Estado” (Ibidem, 79).
Com esta instabilidade política, a 28 de Maio de 1926,
os militares golpearam o Estado na sequência do qual o Marechal Gomes da Costa
assumiu o poder por pouco mais de um mês e foi substituído pelo General António
Oscar de Fragoso Carmona que, instaurando uma ditadura, em Março de 1928, se
fez eleger Presidente da República.
Sublinhando a importância do Acordo Missionário, o
Cardeal Cerejeira atesta-nos que era necessário medir a acuidade do problema
colonial, a nível internacional, e sentir a “responsabilidade da salvação das
almas indígenas que é preciso, como se afirmava no século XVI, conquistar para
Cristo e para a sua Igreja” (MOLINA, 1971:110).
2.2.
Da Concordata ao Estatuto Missionário
A 7 de Maio de 1940, o Governo de Salazar assinou com
a Santa Sé dois documentos que viriam a orientar toda a organização religiosa
do Ultramar Português: a Concordata, que punha fim à lei de separação entre a
Igreja e o Estado, do tempo do Ministro Afonso Costa (1911), e o Acordo
Missionário, que regulava a questão das missões.
A partir destes instrumentos jurídicos, completados,
em 1941, pelo Estatuto Missionário, a evangelização em Moçambique irá
intensificar-se e desenvolver-se sistematicamente.
2.2.1.
A Concordata
A Concordata entre a Santa Sé e o governo português
foi assinada em Roma, a 7 de Maio de 1940 como dissemos acima. Nesta época,
Portugal era interno e politicamente estável, com um governo credível e já
estavam restabelecidas as relações diplomáticas com a Santa Sé. Portugal não se
tinha envolvido na II Guerra Mundial e celebrava na altura o 8º centenário da
Independência (cf. MARIME, 2011:82-83).
A Concordata tinha por objectivo: “regular, por mútuo
acordo e de modo estável, a situação jurídica da Igreja Católica em Portugal,
para a paz e maior bem da Igreja do Estado”. As grandes ideias que parecem ter
dominado estes acordos eram:
Reconhecimento
jurídico da liberdade da Igreja Católica em Portugal;
Restituição dos
bens da Igreja em poder do Estado ou de particulares a este adquiridos;
Prescrever a
nacionalidade portuguesa para arcebispos, bispos, párocos, reitores dos
seminários e, em geral, os directores e superiores dos institutos e o direito
de veto do governo contra candidatos ao episcopado se contra eles houvesse objeções
políticas de carácter geral;
Protecção dos
clérigos no exercício das suas funções e o uso do hábito religioso.
Reconhecimento
da capelania religiosa católica nas prisões, hospitais, orfanatos e
estabelecimentos militares;
Reconhecimento
dos efeitos civis do casamento canônico, ao qual o Estado, por sua vez,
assegura a proibição ao divórcio civil;
Autorização da
entrada de missionários estrangeiros em caso de insuficiência dos missionários portugueses;
Estabelecimento
de casas de formação e de repouso para as corporações missionárias na Metrópole.
Apesar destas leis, importa salientar que, de acordo
com Oliveira, “a Concordata não restaura o antigo regime concordatário, não
cria uma Igreja do Estado e nem agrava o orçamento do Estado” (OLIVEIRA,
1948:397). E forçoso é confessar que foi elaborado no alto espírito de justiça
e de verdade. O Estado aceita a Igreja como ela é. Encontra o facto católico
não só como um facto nacional, mas ainda como o facto fundamental da vida
histórica da nação e tradu-lo juridicamente.
2.2.2.
O Acordo Missionário
O Acordo Missionário era um instrumento diplomático
aceite pelo Estado português e a Santa Sé para regular mais completamente as
relações entre a Igreja e o Estado no que diz respeito à vida religiosa no
Ultramar português.
Assim, no art. 1º, estabelece-se que “a divisão
eclesiástica das colónias portuguesas será feita em dioceses e circunscrições
missionárias autônomas”. O responsável pela organização da vida e apostolado da
diocese é o bispo.
No artigo 2º, permite-se a chamamento dos bispos
diocesanos, “a entrada de missionários estrangeiros, desde que declarem
submeter-se às leis e tribunais portugueses. Esta submissão será a que convém a
eclesiásticos”.
No 6º artigo encontramos a “criação das dioceses de
Luanda, Nova Lisboa, Silva Porto, Lourenço Marques, Beira, Nampula e Díli. Além
disso, nas ditas colónias e na Guiné poderão ser eretas circunscrições
missionárias.
A Santa Sé poderá de acordo com o Governo, alterar o
número das dioceses e circunscrições missionárias. Os limites das dioceses e
circunscrições missionárias serão fixadas pela Santa Sé, de maneira a
corresponderem, na medida do possível, à divisão administrativa e sempre dentro
dos limites do território português.
No 9º artigo prevê-se a concessão de subsídios do
governo da metrópole e das colônias às corporações missionárias, segundo a
necessidade destas e independentemente dos auxílios que receberem da Santa Sé.
Por seu turno, no 10º artigo é prevista a concessão gratuita de terrenos às
missões; no artigo seguinte a isenção de impostos e direitos sobre as
aquisições de objectos de culto e outros a submeter casuisticamente, quando
conexos com actividades missionárias.
No 12º artigo, é reconhecido aos bispos o direito a
honorários pagos pelo Estado, com excepção de ajudas de custo e o direito à
aposentação por conta do mesmo Estado. No artigo 14º é assegurado ao pessoal
missionário o direito a abono de viagens, por conta do Estado, ao requerimento
dos ordinários respectivos.
No 15º artigo, é concedida a liberdade de fundação de
escolas para indígenas e europeus, colégios, institutos, seminários,
catecumenatos, ambulâncias, hospitais, bem como a assistência religiosa a
súbditos portugueses em territórios estrangeiros. O artigo seguinte, fixa que
“nas escolas indígenas é obrigatório o ensino da língua portuguesa, ficando
plenamente livre, em harmonia com os princípios da Igreja, o uso da língua
indígena no ensino da religião católica”.
No 17º artigo, esclarece-se que os ordinários, os
missionários, o pessoal auxiliar e as irmãs e irmãos missionários não são
funcionários públicos. E no artigo 18, estabelece-se a obrigação de,
anualmente, os ordinários e os superiores das corporações missionárias
apresentarem os relatórios das actividades do ano anterior.
Sintetizando, com o Acordo Missionário “os territórios
eram divididos em dioceses e circunscrições missionárias autónomas; além do
reconhecimento missionário, estabeleceram-se subsídios governamentais e as
missões passaram a gozar de alguns privilégios fiscais. O pessoal envolvido na
missionação recebia honorários do Governo” (CAIXINHAS, 1999:448).
2.2.3.
O Estatuto missionário
O Estatuto Missionário foi aprovado a 5 de Abril de
1941 pelo Decreto-Lei no 31207. Inicialmente,
a Concordata e o Acordo Missionário, celebrados entre o governo português e a
Santa Sé, “foram saudados como um bom passo para o reconhecimento da liberdade
de acção da Igreja. Com tais acordos facilitava-se a entrada de missionários em
Moçambique e prometiam-se subsídios à Igreja Católica” (SOUSA & CORREIA,
1998:75).
Por outro lado, com o Estatuto Missionário reconheceu-se
a organização eclesiástica; atribuíam-se subsídios às novas dioceses e
confiou-se às missões o ensino nas escolas para os nativos (2º art.). Mediante
estes acordos, as missões portuguesas continuavam a não depender da Congregação
da Propaganda da Fé. Ao mesmo tempo, abolia-se a prelazia de Moçambique e
criavam-se as três primeiras dioceses supracitadas.
Consequentemente,
a partir de 1940, com a Concordata e
o Acordo Missionário, aumentou consideravelmente o número de congregações
religiosas masculinas e femininas.
2.3.
O Impacto destes acordos na evangelização da Igreja moçambicana
Poder-se-á afirmar, sem margem para o erro, que o
modelo de evangelização posto em prática, durante esta primeira fase sob a
égide do Acordo Missionário, foi, simultaneamente, de uma “pastoral de
transplantação” e duma “pastoral de cristandade” ambos inspirados pela ideia do
padroado, que acabava de ser modernizada pelos novos instrumentos jurídicos que
acompanhavam a Concordata. O objectivo deste método era “integração dos povos
do padroado no mundo português, através da irradiação da civilização lusitana e
das tradições cristãs” (FERREIRA, 1987:76).
Este ideal de integrar os povos das colónias
permaneceu vivo, na maioria das missões até a independência. “A Igreja
transplantou-se da Europa para aqui. Repetem-se os costumes, as fórmulas, os
estilos. Os valores próprios dos diversos grupos ou camadas do povo são
desconhecidos ou não aceites”(Cons. Pastoral da Matola, 1974:5).
Como precisamos antes, um dos objectivos prioritários
da grande reorganização missionária, de 1940, era o de erigir pelo menos uma
residência ou centro de evangelização. A Igreja era concebida como fortaleza e
refúgio, onde as pessoas deviam ir. Ela era, sobretudo, a hierarquia, a
instituição, o rito. Dava-se o primeiro lugar às práticas, às devoções, à
sacramentalização massiva do povo simples e ignorante.
A finalidade da acção missionária neste tempo era a
conversão das almas, o cuidado das almas e de ganhar para Cristo o maior número
de almas possíveis (cf. BENTO XV, 1919:34), retomando a política de
evangelização adotada por Bento XV decênios muito pretéritos.
Entrementes, com a nova política de implantação da
Igreja, como transplantação da instituição eclesiástica, era quase imposta
pelas ideias também reinantes duma pastoral de cristandade. Insistia-se num
alargamento quantitativo e geográfico, que produzia muitos baptizados, mas
dificilmente criava comunidades cristãs.
“As comunidades eram rebanhos obedientes e dóceis,
aceitando o alimento que lhes era dado, sem terem a possibilidade de se
exprimir para pedir outro alimento mais a seu gosto e mais apto às suas
necessidades. Muitos actos cristãos não eram actos humanos. Eram realizados,
mas não compreendidos”(FERREIRA, 1987:79). O modo de evangelização baseava-se
predominantemente na escolarização, com a mentalidade concordatária e
integradora que lhe era inerente.
III. APRECIAÇÃO DO
GRUPO
Infelizmente a I Guerra Mundial também teve consequências
na missão evangelizadora da Igreja em Moçambique. Isto foi devido à entrada de
Portugal na guerra contra os alemães em 1916. Como efeito, “os padres do Verbo
Divino são obrigados a deixar a missão” (SOUSA, 1991:88).
Apesar da dedicação e sacrifício dos padres
diocesanos, a Igreja de Moçambique, com o abandono forçado de tantos
missionários não deixou de sofrer um duro golpe. Será um atraso no seu
crescimento, mas a força de espírito que animou os que foram expulsos conduzirá,
um dia, novos missionários que retomarão a obra encetada por tão heróicos
apóstolos.
É certo que o regime de colaboração criado pelos novos
acordos trouxe muitas vantagens para a nossa Igreja. Não faltaram
incompreensões geradoras de conflitos, completamente contrários ao espírito da
Concordata. Mas devemos lamentar o espírito que acompanhou o processo de
missionação. Este fez das terras de missão receptáculos inconscientes do
Evangelho de Cristo e os nativos foram forçados a abandonar as suas práticas
culturais e vivências religiosas.
CONCLUSÃO
Apesar da Primeira Guerra Mundial
ter sido desencadeada após a cadeia de acontecimentos que se seguiram ao
assassinato de Francisco, as origens da guerra são muito mais profundas,
envolvendo uma série de questões em torno de políticas nacionais, culturas,
economia e uma teia de complexas alianças e contrabalanças que se desenvolveram
entre as diferentes potências européias ao longo do século XIX após a derrota
final de Napoleão Bonaparte em 1815 e o Congresso de Viena.
Algumas das principais causas para o
início do conflito foram: o imperialismo; as disputas prévias não resolvidas; um
complexo sistema de alianças; governos não-unificados; os atrasos e
discrepâncias nas comunicações diplomáticas; a corrida armamentista; o planejamento
militar rígido; e movimentos ultra-nacionalistas, como o irredentismo;
Inicialmente
a Concordata e o Acordo missionário celebrados entre o governo português e a
Santa Sé foram saudados como um bom passo para o reconhecimento da liberdade de
acção da Igreja. Com tais acordos, facilitava-se a entrada de missionários em
Moçambique e prometiam-se subsídios à Igreja Católica conforme assinalamos
anteriormente.
Com
o Estatuto Missionário reconhece-se a organização eclesiástica, atribuíam-se
subsídios às novas dioceses, e confiou-se às missões o ensino nas escolas para os
nativos. Esta colaboração quase obrigava a acção missionária que actuasse em
moldes nacionais. Mediante estes acordos as missões portuguesas continuaram a
não depender da Congregação da Propaganda Fide.
Ao
mesmo tempo que apoiava-se a prelazia de Moçambique e criava-se as três
primeiras dioceses: Lourenço Marques (Maputo), Beira e Nampula. A partir de
1940 com a Concordata e Acordo Missionário aumentou consideravelmente o número
de congregações religiosas: masculinas e femininas. O governo português tinha o direito de veto, nas
nomeações dos bispos, e criou-se a hierarquia com a sede arcebispal em Maputo.
BIBLIOGRAFIA
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