sábado, 11 de fevereiro de 2017

A BELEZA DE NALIYE


Numa das povoações de um país muito distante, vivia uma jovem de nome Naliye. Ela fora famosa por causa da sua beleza. Certo dia, um dos notáveis homens da aldeia vizinha ouvira falar da jovem Naliye e da sua beleza. Curioso em conhece-la, fizera tudo para o efeito. Porém, devido as suas ocupações que não lhe deixavam com tempo, resolver efectuar correspondências via cartas.
Dito feito, fizera uma missiva para a jovem, na qual ele exponha seus planos futuros com ela. Depois de muitas correspondências via cartas, na última ele pedia que ela mandasse a sua foto como sinal do seu assentimento. Algo curioso da jovem é que nunca mandava fotos de corpo inteiro, somente as do tipo passe. Volvidos muitas luas de conhecimento mútuo, ambos decidiram oficializar junto dos país a sua relação.
Como era de esperar e, porque o desejo dos pais era de ver a filha noivada, a resposta ao jovem apaixonado foi SIM. E também porque era desejo do moço, não tardou a propor aos país da moça e aos seus a data do seu lobolo.  E Ele sugerira o dia 25 de Dezembro daquele ano de Senhor para o seu lobolo para que a data ficasse marcada para sempre nas memórias dos dois e dos demais convivas.
Tudo posto e preparado, chegara o dia marcado. Já na hora estabelecida pelo tio da menina, pois, e um grupo de tribos da tradição mater linear, o moço lá estava no lugar escolhido para as cerimónias do lobolo.
Segundo o rito e princípios daquela tribo, o primeiro a chegar no local das cerimónias é o moço acompanhado pelos seus pais se estiverem vivos, os famíliares mais próximos e os demais.
Após muito tempo de espera, os presentes ouviram o rufar dos tambores que anunciavam a chegada da noiva. Era de facto uma grande multidão de pessoas que cantava, dançava e gritava. Cada vez que os presentes ouviam os cantos dos que chegavam a expectativa aumentava ainda mais. Entretanto, quanto mais se aproximavam os cantores, mais ficava clara a visibilidade dos factos. No meio daquela amálgama, uma jovem muito linda, vestida de noivo e bem adornada. Era com certeza a Naliye, mas na cadeira de rodas. Pois, era portador de deficiência!


Moral da história: Não se pode julgar a acção do filme pela cortagem.

quinta-feira, 16 de julho de 2015


PROGRAMA DO RETIRO PARA O GRUPO CORAL – SÉ CATEDRAL
8h – 10h : Missa no Invinha
10h: 30`- 11h: I Palestra
20`: Meditação individual
11h:25`- 11:55`:  II Palestra
12h:15`: Almoço
13h:30`- 14h:30`: Adoração ao Santíssimo
15h: Fim das actividades do dia.

Tema
COMO VIVO A LITURGIA
Introdução
O que é retiro? É um afastamento temporário das actividades para conversar com Deus. É reflectir sobre  a nossa vida. É subir ao monte. É rezar. É entrar em intimidade com Deus. É dialogar com Deus. No entanto, no retiro um dos elementos importantes é o silêncio (há diferença entre calma e silêncio). Muitas das vezes se ouve dizer por aí: Deus não me escuta ou não me responde!? Como diz Santa Teresa de Calculta: ‘O mundo faz tanto barulho que não conseguimos ouvir o que Deus nos diz’. Deus sempre fala-nos algo. Nós é que não escutamos. Porque o mundo faz tanto barulho.

1.    O que é Liturgia?
Quando se fala de liturgia, muita gente entende somente a dança durante a celebração Eucaristica. Algumas comunidades quando domingo não se dança não houve liturgia. Liturgia é isso?
A palavra liturgia (do grego λετομργία, [γαóς = povo; ργία = serviço]”serviço público” ou ”serviço do culto”). Neste sentido, a palavra liturgia aplicada a uma pessoa, seria alguém que fazia serviço público ou alguém que liderava uma cermónia sagrada.  
Liturgia: é uma acção sagrada, através da qual, com um rito, na Igreja e mediante a Igreja, é exercitada e continuada a obra sacerdotal de Cristo, isto é, a santificação dos homens e glorificação de Deus. Assim sendo,
ü   Na liturgia actualiza-se a obra da nossa redenção
ü   Na liturgia Cristo faz-se presente como agente principal
ü   Na liturgia a Igreja faz o que Cristo fez
ü   O fim da liturgia é a glorificação de Deus e a santificação dos homens.

2.    Meditação das partes da Missa
1.    Canto de entrada: dá início a celebração. Favorece a união dos fiéis reunidos e introduz o espírito ao Mistério do tempo litúrgico. Ao mesmo tempo acompanha a procissão de entrada do sacerdote e dos ministros (IGMR:  Introdução geral do Missal Romano : nº 46).
2.    Procissão de entrada: representa o povo de Deus, que está em marcha em direcção ao encontro de Deus. Também recorda-se a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém (Lc 19,28-40).
3.    Saudação do altar: chegados ao presbitério, o sacerdote, diácono e os ministros inclinam a cabeça em sinal de veneração. Se houver sacrário ajoelham-se em sinal de adoração.

4.    O beijo ao altar: o altar é a mesa onde se celebra a Ceia do Senhor. É  o centro de acção de graças e é sinal da presença de Cristo na comunidade cristã. Assim sendo, o sacerdote que está para guiar a assembleia reunida, beijando o altar, manifesta diante de toda a comunidade cristã, o seu amor e a sua adoração a Cristo Senhor. É neste espírito, que o sacerdote e o diácono beijam o alta no início e no fim da Missa.

5.    O sinal da cruz: terminado o cântico de entreda, o sacerdote com toda assembleia fazem sobre si próprios o sinal da cruz. Este gesto é feito por todos, porém é o sacerdote que pronuncia a formula trinitária: em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e a assembleia responde amen. Com estas palavras, indicam em nome de  quem a assembleia se reúne. O sinal da cruz recorda aos cristãos, o Misterio Pascal, que tem no centro a cruz, onde Cristo deu a vida por nós. Quando fazemos o sina da cruz colocamo-nos sob sua protecção.

6.    Saudação da assembleia: em cada encontro humano, quem preside, antes saúda os presentes. O padre diz: A graça do nosso Senhor Jesus Cristo, o Amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo, esteja convosco. A assembleia responde: bendito seja Deus que nos reuniu no Amor de Cristo. A expressão: o Senhor esteja convosco, e a resposta: Ele está no meio de nós, aparece 4 vezes: no início da Missa, na proclamação do Evangelho, no prafácio e na bênção final. Tudo isto, mostra a presença de Deus no meio da assembleia celebrante, desde o início até ao fim da Missa.

7.    Acto penitencial: a Eucaristica sendo a celebração do amor com Deus, é necessário destruir qualquer obstáculo, antes de mais nada. Por isso mesmo, o acto penitencial é uma espécie de preparação para dignamente celebrar o grande amor de Deus para o homem. Por outro lado, o acto penitencil, nos mostra a consciência humana de se reconhecer pecador e necessitar o perdão de Deus. De notar que toda celebração eucaristica é repleta do pedido de perdão. E durante a celebração recebemos o perdão:
ü No glória: quando dissemos: vós que tirais o pecado do mundo, tende piedade de nós.
ü Na oração sobre as oblatas: o padre diz: lavai-me Senhor da minha iniquidade e purificai-me do meu pecado.
ü No pai nosso rezamos: perdoais-nos as nossas ofensas
ü No cordeiro dissemos: que tirais o pecado do mundo, tende piedade de nós.

8.    Glória: Depois de receber o perdão das culpas, a assembleia encontra uma grande alegria, por ter voltado para o Pai. Por isso, glorifica e exalta a misericórdia de Deus (IGMR nº 53).

9.    Oração colecta: a palavra colecta do latim colligere, significa recolher. Ela recolhe numa única forma sintética todas as intenções particulares cada membro da assembleia e apresenta-se a Deus. Por isso, o Padre quando diz "oremos", fica um momento silêncio para os fiéis tomarem consciência de estarem na presença de Deus e formularem interiormente as suas intenções particulares (IGMR nº 54).

10.         Liturgia da Palavra: a parte principal da liturgia da palavra são as leituras Bíblica. A 1ª leitura sempre do A.T. 2ª leitura do N.T e a 3ª leitura é o Evangelho. Nestas leituras com a Homilia, Deus fala ao seu Povo, revela-lhe o Mistério da Redenção e Salvação como alimento espiritual (IGMR nº 55).

11.    Salmo responsorial: favorece a meditação da Palavra de Deus e permite o diálogo entre Deus e seu povo (IGMR nº 61).

12.         Aclamação do Evangelho: a palavra hallelui-yah significa louvai a Deus aclamação é um convite para louvor a Deus. E assembleia dos fiéis acolhe e saúda o Senhor que vai-lhes falar, no Evangelho, e professa a sua fé por meio de aclamação.

13.         O Evangelho: é o centro da Liturgia da Palavra, no qual Cristo é a unidade. Antes da leitura,o proclamador sauda o povo estas palavras: o Senhor esteja convosco. Esta saudação tem dois objectivos:
ü Convidar a assembleia a reconhecer no Evangelho a presença de Cristo;
ü Dispor a assembleia a escutá-lo.
O proclamador anuncia o nome do Evangelho a ler, fazendo sinal da cruz sobre o livro, depois ele próprio e cada um dos presentes faz-se na teste, nos lábios e no peito (IGMR nº 95). Com estes gestos, pretende-se mostrar o percurso da Palavra de Deus:
ü Livro: Deus que fala;
ü Na testa: esta palavra que deve ser meditada com a mente;
ü Nos lábios: que deve ser professada e anunciada com a boca;
ü No peito: que deve ser conservada no coração.
No fim da leitura, o proclamador beija o Evangelho dizendo em silêncio: por este santo Evangelho, perdoai-nos Senhor. O beijo é sinal de veneração, adoração e respeito.

14.    Homilia: alimenta e fortalece a fé dos dos cristãos. Ela é a actualização da Palavra de Deus para a comunidade celebrante. Ela deve reavivar e fazer maturar a fé no mistério celebrado.

15.    Credo: é uma afirmação da unicidade da fé. Com o Credo a assembleia responde a Palavra de Deus escutada nas leituras e na homilia: creio em um Deus, creio em um só baptismo, creio em numa só Igreja. Sem fé, a nossa celebração não terá efeito e nem tão pouco vai mudar os nossos corações.

16.         Oração Universal: chama-se oração universal, por ser oração de todos os homens do mundo inteiro. Ela liga todas as comunidades do mundo inteiro. Na oração universal, o Povo responde de algum modo, a Palavra de Deus recebida na fé.
17.         Ofertório: ao iniciar a liturgia eucarística, leva-se ao Altar os dons que se vão converter no Corpo e Sangue de Cristo. Além do pão, vinho e água, são trazidas pelos fiéis outras ofertas, sinal da sua participação plena e activa no sacrifício de Cristo, que na Eucaristia se torna presente e operante.

18.    Gota de água no vinho: teologicamente a gota de água que se coloca no vinho antes da consagração representa a assembleia reunida e vinho Sangue de Cristo. Com esta junção da água no vinho significa que a assembleia entra no Cristo e transforma-se em Cristo porque a gota que é posta posta no vinho não se transforma em água mas continua a ser vinho. Assim, não é assembleia que transforma Cristo porém, é Cristo que transforma assembleia em Cristo, logo o nome de cristão, tudo se faz por Cristo, com Cristo e em Cristo.

19.    Convite à oração: o convite do sacerdote: orai irmãos para que o meu e o vosso sacrifício seja aceite por Deus Pai todo-poderoso.
Resposta da assembleia: receba o Senhor por tuas mão este sacrifício para glória do seu nome, para o nosso bem e de toda santa Igreja.
Nesta esta compreendemos:
ü Solidariedade dos fiéis para com o celebrante que está na pessoa de Cristo;
ü A humanidade do sacerdote que reconhece ser indigno diante o mistério que celebra e pede a comunidade para rezar por ele.

20.    Oração Eucarística: eta é precedida pelo prefácio. E este começa por um diálogo:
ü o Senhor esteja convosco: esta frase mostra a presença de Cristo na assembleia que está presente desde o princípio da celebração.
ü Ele está no meio de nós: a assembleia deseja o mesmo ao sacerdote.
ü Corações ao alto: com esta expressão o padre deseja a assembleia a entrar na acção de graças com um coração único.
ü O nosso coração está em Deus: com esta resposta, a assembleia exprime a sua conversão e une-se ao Senhor.
ü Dêmos graças ao Senhor nosso Deus: esta expressão indica a finialidade do encontro dar graças a Deus pelo sacrifício eucarístico que estamos a celebrar.
ü É nosso dever, é a nossa salvação: este é o centro de toda teologia da criação.

21.    Pai nosso: nesta oração pede-se o pão de cada dia, que para os cristãos, invoca o pão eucarístico. Pede-se também a purificação dos pecados para receber dignamente a Sagrada Comunhão.
22.         A paz: com o rito da paz, a Igreja implora a paz e a unidade de todos os homens. E a fonte desta paz  é Deus através de Cristo. E esta paz assume dois sentidos:
ü Dimensão vertical: a paz parte de Cristo e desce para cada um dos homens;
ü Dimensão horizontal: os fiéis exprimem uns aos outros, a comunhão fraterna, recíproca, na caridade e na reconciliação antes de comungar (IGMR nº 82).
23.    Cordeiro de Deus: recorda-nos Cristo levado ao matadouro. Os fiéis se dirigem a Ele considerando-O  vítima que foi imolado pela salvação do mundo. Também pedimos a paz e reconciliar-nos com Deus e com os irmãos antes de receber a Eucaristia.

24.    Fracção do Pão: significa que os fiéis apesarem de serem muitos, se tornaram só Corpo pela comunhão do mesmo Pão da Vida que é Cristo morto e ressuscitado pela salvação do mundo (1Cor 10, 17).

25.    União do Corpo e do Sangue: o sacerdote parte um padecinho do Pão e deita no Cálice para significar a unidade do Corpo e do Sangue de Cristo na obra de salvação. O sinal da união destas duas realidades, que visivelmente parecem separadas, quer mostrar a realidade invisível da perfeita unidade de Cristo.
26.    Elevação do Corpo e Sangue de Cristo: a elevação dos dons consiste em reconhecer Deus como seus dons. Ele fez chegar até nós através da mediação do fruto da terra e do trabalho do homem. há duas finalidades na ostentação:
ü 1ª – convidar os fiéis ao banquente eucarístico, ou seja, convidar a comungar o Corpo de Cristo, que é alimento espiritual, que sirva da nossa defesa, segurança, remédio e libertação do mal.
ü 2ª – mostrar  Cristo que resgata os nossos pecados, ao dizer o padre: eis o cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.

27.    Purificação: na reflexão teológica, a purificação das alfaias é a purificação de tosos os corações dos fiéis reunidos.
28.    Acção de graças: a assembleia louva a Deus pela Palavra, Eucaristia e Salvação.
29.    Bênção final: o sacerdote diz: ide em paz o Senhor vos acompanhe e a assembleia responde: Graças a Deus (IGMR nº 168). Com estas palavras compreendemos que vamos na paz de Cristo e com esta paz, temos que ir ao mundo inteiro, anunciar aos nossos irmãos, com obras e palavras, o que ouvimos, vimos tocamos.

Conclusão (reflexão)
Vendo tudo o que ouvi  hoje, quantas vezes já rezei de facto?
Será que quando entro para a Missa, participo ou sou assistente?
Que me distrai durante as celebrações?
Que compromisso faço para a minha vida cristã da Missa?

NB. Apesar das minhas imperfeições, tenho que ter a consciência de que: Cristo amou-me, ama-me e me amará!  E o meu dever e salvação como criatura é LOUVAR A DEUS, mesmo enquanto meus hinos de bênção não aumente nem diminue a grandeza de Deus!

terça-feira, 23 de julho de 2013

RESUMO DA OBRA DE BENTO XVI - A INFÂNCIA DE JESUS DE NAZARÉ



JOSEPH RATZINGER – BENTO XVI

JESUS DE NAZARÉ

PRÓLOGO

A INFÂNCIA DE JESUS


PREFÁCIO
O autor dá-nos conta que este não se trata do terceiro volume, mas de uma espécie de pequeno “pórtico” dos dois volumes anteriores sobre a figura e mensagem de Jesus de Nazaré. O livro é uma interpretação, em diálogo com exegetas do passado e do presente, aquilo que Mateus e Lucas narram acerca da infância de Jesus, no início dos seus Evangelhos.

CAPÍTULO I: DONDE ÉS TU? (Jo 19,9)
Trata-se da pergunta feita por Pilatos no decurso do interrogatório. É uma pergunta sobre a origem de Jesus como questão acerca do seu ser e da sua missão, perguntas que os 4 Evangelhos procuram responder.
Pilatos quer saber a verdade (cf. Jo 18,38), quer saber a origem de Jesus para compreender quem era Ele e o que queria: por um lado os acusadores pedem condenação à morte por Ele se ter apresentado como Filho de Deus; por outro lado Ele declara ser rei mas especificando que seu reino não é de cá (Jo 18,36) e acrescenta dizendo para quê veio ao mundo: dar testemunho da verdade (Jo 18,37).
A pergunta sobre “donde” é Jesus, como questão de sua origem íntima, aparece tanto em João como nos sinópticos. Por exemplo, em João temos: “não conhecemos nós o Pai e a mãe? Como se atreve agora a dizer eu desci do céu?” (6,42); em Lucas 4,21 Jesus diz que as palavras da Sagrada Escritura se referiam a si mesmo e à sua missão; em Marcos: “não é Ele o carpinteiro, o filho de Maria…” (Mc 6,3). É que eles sabem muito bem quem é Jesus e donde vem: é um entre outros, é um como nós. A isto vem juntar-se o facto de Nazaré não ser lugar para realização de tal promessa, assim diz Natanael: “De Nazaré pode vir alguma coisa boa?” (Jo 1,45-46). A vida normal de Jesus, o operário provinciano, não parece esconder qualquer mistério; a sua proveniência revela-O como igual a todos os outros. A origem de Jesus é simultaneamente conhecida e desconhecida: aparentemente, é fácil de explicar e todavia sentem que a explicação não é exaustiva.
Mateus e Lucas apresentam uma genealogia. Para Mateus a genealogia aparece como título para o Evangelho. Já Lucas a coloca no início da vida pública de Jesus, como se fosse uma apresentação pública de Jesus. Em Mateus há dois nomes que são determinantes para compreender donde é Jesus: Abraão e David. É com Abraão que começa a história da promessa: Abraão é peregrino não só saindo do país das suas origens para terra prometida, mas também enquanto sai do presente para se encaminhar para o futuro. A Carta aos Hebreus diz de Abraão: ele “esperava a cidade bem alicerçada…” (Hb 11,10). Para Abraão a promessa se refere a seu descendente por meio do qual o Senhor abençoaria todos os povos da terra (Gn 18,18), e assim na conclusão do Evangelho o ressuscitado diz aos discípulos para fazerem discípulos de todos os povos (Mt 28,19). David é o rei a quem foi feita a promessa dum reino eterno (2 Sm 7,16).
A genealogia de Mateus está estruturada em 3 grupos de 14 gerações. As letras hebraicas do nome de David totalizam o valor numérico de 14, o seu nome e a sua promessa caracterizam o caminho de Abraão até Jesus, o Cristo-Rei, cujo trono está firme para sempre. Na genealogia de Mateus, antes de Maria aparece nome de 4 mulheres (Tamar, Raab, Rute e a “mulher de Urias”, porque? Diz-se que tais mulheres foram pecadoras, nesta ordem de ideia Jesus teria tomado sobre Si os seus pecados; outro dado dá conta que nenhuma delas era judia, torna-se visível que a missão de Jesus se destina a judeus e a pagãos (gentios). Na ordem das gerações: “Abraão gerou Isaac…”, apenas se diz que Jesus era esposo de Maria da qual nasceu Jesus que se chama Cristo (1,16), Mateus diz-nos que José não era pai de Jesus, pois Maria concebeu por obra do Espírito Santo (1,20). Ao aparecer o nome de Maria no fim da genealogia, mostra que Maria é um novo início, recomeça de modo novo o ser humano.
Comparada a genealogia de Mateus, a de Lucas apresenta várias diferenças: são poucos os nomes que concordam entre si, nem sequer no nome do pai de José. Importa neste ponto apenas a estrutura simbólica em que Jesus aparece colocado na história. Lucas mergulha às raízes de Jesus nas profundezas do alto: “… Adão, filho de Deus” (3,38), ou seja, legalmente Jesus era filho de José, mas sua origem verdadeira é descrito nos capítulos precedentes. Lucas apresenta 76 nomes sem qualquer articulação, aparece entretanto 11 vezes sete elementos, uma alusão muito discreta de que chegou a plenitude dos tempos com Jesus; com Ele começa a hora decisiva da história universal, Ele é o novo Adão. A genealogia é expressão de uma promessa que diz respeito a toda a humanidade.
No Prólogo de João (1,1.14).  encontramos de forma explícita e grandiosa a resposta à pergunta sobre “donde” é Ele, e a partir de “donde” é Jesus, definiu a identidade dos seus discípulos: “No princípio era o Verbo; o Verbo estava com Deus; e o Verbo era Deus (…) e o Verbo fez-se carne e levantou a sua tenda no meio de nós”. A carne de Jesus, a existência humana, é a tenda do Verbo; Jesus é a tenda da reunião e o Templo. A sua origem, o seu “donde”, é o próprio princípio: Jesus vem de Deus; Ele é Deus. E todos os que O receberam tornaram-se filhos de deus (1,12-13): todos os crentes nasceram primeiramente do sangue e da vontade do homem, mas a fé dá-lhes um novo nascimento: agora nascem de Deus. João resumiu o significado das genealogias e ensinou-nos a compreendê-las também como explicação da nossa própria origem: em Jesus nós nascemos de Deus.

CAPÍTULO II: O ANÚNCIO DO NASCIMENTO DE JOÃO BAPTISTA E DE JESUS

  1. Caracterização literária dos textos
Os 4 Evangelhos apresentam a figura de João Baptista como precursor de Jesus. Mas qual seria a fonte de Mateus e Lucas? Lucas (1-2) narra uma história da infância de Jesus que traz a interpretação sobre a antiga Escritura, não é uma simples ilustração das palavras antigas mas a realidade que as palavras aguardavam (pois por se sós não eram reconhecíveis). Às vezes Lucas alude a Maria, a Mãe de Jesus: aquela que guardava todas estas coisas em seu coração (2,19.51). Interessa sim que Mateus e Lucas, cada um à sua maneira, queriam não tanto narrar histórias mas escrever história, real, embora interpretada e compreendida com base na Palavra de Deus.
  1. O anúncio do nascimento de João
O anúncio do nascimento de João aparece ligado ao anúncio do nascimento de Jesus.

Zacarias, pai de João era sacerdote e de igual modo Isabel era da ascendência sacerdotal (Cf. Lc 1,5), necessariamente João Baptista é sacerdote, nele o sacerdócio da Antiga Aliança encaminha para Jesus. Zacarias e Isabel eram justos diante de Deus: os justos são pessoas que vivem as directivas da lei a partir de dentro (1,6).
O contraste do anúncio: de um lado está Zacarias, sacerdote, o Templo, a liturgia; do outro lado, uma mulher jovem desconhecida, Maria, uma casa particular em Nazaré (casa humilde e lugar desconhecido nas Sagradas Escrituras). O sinal da Nova Aliança é a humildade, a vida escondida: o sinal do grão de mostarda.
O anúncio do nascimento de João obedece a textos veterotestamentários: por um lado as histórias semelhantes aos da promessa de um filho gerado de pais estéreis (Abraão – Gn 18,10-14; Ana, mãe de Samuel – 1 Sm 1) para dizer que João situa-se na esteira daqueles que nascera, de pais estéreis graças a intervenção prodigiosa daquele Deus para quem nada é impossível. Quando se diz que João não beberá vinho nem bebida alcoólica (Lc 1,15), mostra que ele se insere na tradição sacerdotal (Lv 10,9), mais tarde ele anunciará o novo sacerdócio que aparecerá com Jesus; por outro lado alguns textos proféticos dos livros de Malaquias (3,23-24) e Daniel (9,21s): a partir de Malaquias, a missão de João é interpretada com base na figura de Elias, aquele que teria a missão de preparar o povo para a chegada do Senhor (João é inserido na categoria de profetas); a partir de Daniel, a hora do anúncio, é a hora da revelação, da instauração da justiça eterna que entra no tempo, assim se percebe o “cumpriu-se o tempo”.
  1. A anunciação a Maria
O anjo ao aparecer a Maria não usa a habitual saudação judaica, shalom – a paz contigo, mas a fórmula grega khaire – Avé ou Alegra-te. O que significa: abre-se imediatamente também a porta para os povos do mundo; mas também soa a palavra da promessa da profecia de Sofonias (3,14-17): quer Sião quer Maria devem alegrar-se porque o Senhor está no meio deles (no seio deles), em alusão a Ex 33,3; 34,9 onde a habitação de Deus na Arca da Aliança é tida como um habitar de Deus no seio de Israel.
Maria procura saber do anjo “como” se dará a concepção e dentre as promessas, encontramos “O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra…” (Lc 1,35): a nuvem sagrada (shekinà) é sinal visível da presença de Deus; a nuvem estende sua sombra sobre os homens; sobre a sombra que desce com o Espírito Santo é retomada a teologia relativa a Sião, mais uma vez Maria aparece como a tenda viva de Deus, na qual ele quer habitar, no meio dos homens.
O anjo anuncia o nome do menino que vai nascer: Jesus. No nome de Jesus esconde-se o tetragrama YHWH, o misterioso nome de Deus que agora é ampliado para Deus salva. A revelação do nome de Deus que começou na sarça-ardente é completada em Jesus (cf. Jo 17,26). Este anúncio é efectuado numa altura em que já não era um herdeiro de David a governar, é como se Deus tivesse se esquecido da sua promessa; o anjo anuncia que Deus não esqueceu a sua promessa, no menino que Maria conceberá, ela se tornará realidade: o seu reino não terá fim, diz Gabriel a Maria. O reino do Filho de David, Jesus, estende-se de mar a mar, de continente a continente, dum século ao outro. Ora, seu reino não é de cá (Jo 18,4), não está construído sobre um poder mundano, mas funda-se apenas na fé e no amor; é a grande força de esperança num mundo que parece estar abandonado por Deus.
Quanto a reacção: Maria, primeiro diferentemente de Zacarias, não ficou perturbada e cheio de temor (Lc 1,12) mas reflectiu (entrou em diálogo consigo mesma); ela torna-se imagem da Igreja que reflecte a Palavra de Deus, procura compreendê-la e guarda o dom da mesma na sua memória. Em segundo lugar, Maria formula a enigmática questão: como será isso?: Maria não vê modo algum de se tornar mãe de Messias pela via conjugal e só então o anjo confirma-lhe que não será mãe pelo modo normal depois de ser recebida em casa de José, mas através da sombra da força do Altíssimo, pela vinda do Espírito Santo, pois a Deus nada é impossível (Lc 1,37). Finalmente temos a terceira reacção, a resposta. Bernardo afirma que no momento do pedido a Maria, o céu e a terra como que suspendem a respiração. Dirá “sim”? E é neste momento que do seu coração surge a resposta: “faça-se em mim segundo a tua palavra”. Então o anjo se retirou… Maria fica sozinha, ela deve prosseguir pelo seu caminho que passará através de muitas obscuridades até a hora da cruz. Quantas vezes, em tais situações, Maria não terá voltado interiormente à hora do anúncio e recordado o “alegra-te”, “não temas”.
  1. Concepção e nascimento de Jesus, segundo Mateus
Maria, pelo noivado, já podia ser chamada esposa de José. Ora muitas ideias apareceram em sua cabeça, inclusive a de abandoná-la em segredo. José é tido como homem justo (zaddik) não por tal decisão mas porque o era, e assim é inserido entre as grandes figuras bíblicas, a começar por Abraão, o justo. O Sl 1 apresenta a imagem clássica do justo: o carácter pessoal da justiça é a confiança em Deus; trata-se de um homem que tem suas raízes nas águas vivas da Palavra de Deus; José procura aplicar a lei de maneira justa, fá-lo com amor; procura a unidade entre o direito e o amor. O anjo aparece a José em sonho, mas um sonho que revela realidade; só uma pessoa atenta ao divino pode receber a mensagem desta forma; esta mensagem requer dele a fé. José é interpelado como filho de David, o que quer dizer que enquanto portador da promessa feita a David, ele deve fazer-se garante da fidelidade de Deus. E anjo diz: “não temas” aceitar esta tarefa, que pode suscitar temor. A seguir é confiado a José a missão de dar o nome, José deve assumi-lo como seu filho; o nome é Jesus (Jeshua) que significa Jahvé é salvação; e esclarece em que consiste esta salvação: Ele salvará o povo dos seus pecados. É que a expectativa comum da salvação estava orientada para a restauração do reino davídico; do bem-estar material, de tal modo que a promessa do perdão dos pecados parece não ter em consideração o sofrimento concreto de Israel; muitos dos que se sentiam oprimidos não era tanto pelos pecados mas por falta de liberdade e pela existência miserável. Mas a verdade demonstra a prioridade do perdão dos pecados como fundamento de toda a verdadeira cura do homem. Jesus quer chamar atenção ao homem para o cerne do seu mal, fazendo-lhe ver: se não estiver curado nisto então apesar de todas as coisas boas que possas encontrar, verdadeiramente não estás curado. A conclusão da narrativa é que José se levantou do sono e fez o que lhe fora mandado pelo anjo do Senhor, mais uma vez demonstra ser justo seguindo a ordem de Deus.
Quanto ao cumprimento da profecia ( Mt 1,22-23; cf. Is 7,14): surgiram muitas interpretações, a verdade é que o vaticínio do profeta, segundo Raiser, é como um buraco de fechadura miraculosamente preparado, no qual a chave, Cristo, entra perfeitamente. A profecia de Emmanuel cumprida em Jesus é um sinal que diz respeito ao mundo inteiro e não tanto ao contexto do rei Acaz.
  1. O parto virginal: mito ou verdade histórica?
Será que se trata de uma lenda piedosa que procura interpretar ou exprimir o mistério de Jesus? Alguns estudiosos admitiram que a narração do nascimento virginal de Jesus deriva das narrativas sobre a geração e o nascimento dos faraós egípcios; contudo tal hipótese tem a ver com uma teologia política que quer colocar o rei na esfera do divino e assim legitimar a sua pretensão divina. Outros textos de influência greco-romano que vê no nascimento de Jesus por obra do Espírito Santo como a união entre Zeus e Alcmena, da qual nasceu Hércules ou a união entre Zeus e Danae, da qual nasceu Perseu, etc. Contudo é preciso entender que Jesus não é nenhum semideus. Jesus nascido de Maria é plenamente homem e plenamente Deus. As narrações de Mateus e Lucas não são formas desenvolvidas de mitos; mas uma tradição transmitida que conserva o sucedido. Quem lê as narrativas bíblicas e as compara com as tradições semelhantes de que antes se falou brevemente vê imediatamente a diferença profunda. Não existe nada de contactos físicos entre Deus e os homens. É a obediência de Maria que abre a porta a Deus, que com sua Palavra, seu Espírito, cria nela o Menino. A Deus é concedido agir sobre as ideias e os pensamentos na esfera espiritual, mas não sobre a matéria, isto para o mundo moderno, mas Deus também tem poder sobre a matéria se não, não seria Deus. Com sua concepção e ressurreição Cristo inaugurou uma nova criação; e estes dois factos são elementos fundamentais da nossa fé e um luminoso sinal de esperança.

CAPÍTULO III: O NASCIMENTO DE JESUS EM BELÉM

  1. Quadro histórico da narração do nascimento no Evangelho de Lucas
“Por aqueles dias, saiu um édito da parte de César Augusto para ser recenseada toda a terra” (Lc 2,1): com estas palavras Lucas explica o porque de Jesus ter nascido em Belém. O nascimentode Jesus na cidade de David, lugar da promessa, situa-se no quadro da grande história universal. Porque ligar Jesus a Augusto? Augusto era a figura política do momento, na inscrição de Priene (ano 9 a.C.) ele é chamado salvador, um título reservado a Zeus, Epicuro e Esculápio, e na tradução grega do A.T este título era reservado exclusivamente para Deus. Augusto era tido também como aquele que trouxe a paz.
Um problema fácil de esclarecer: o recenseamento teve lugar no tempo do rei Herodes, o Grande, que porém morreu no ano 4 a.C. Ora sabe-se a contagem dos anos feita pelo monge Dionísio teve erro. A ser assim temos de fixar a data do nascimento de Jesus alguns anos antes: para Josefo o recenseament deu-se no ano 6 d.C. na altura que Quirino era governador, contudo ele já actuava por volta do ano 9 a.C na Síria, e que na opinião de Alois Stoger, leva a crer que o recenseamento se desenrolava lentamente, estendendo-se por alguns anos. Contudo, acerca dos detalhes, poder-se-á sempre discutir. Permanece difícil lançar um olhar sobre a vida diária de um organismo distante de nós e tão complexo como foi o Império Romano. Mas os conteúdos de Lucas permanecem, apesar de tudo, historicamente credíveis, já que ele resolveu expô-los, como diz no prólogo do seu Evangelho, depois de tudo ter investigado cuidadosamente (Lc 1,3). Fê-lo com meios à sua disposição; ele estava mais perto das fontes e dos acontecimentos do que nós, apesar de toda a erudição histórica. Até porque a propósito do nascimento de Jesus, não temos outras fontes além das narrativas da infância de Mateus e Lucas. Fica claro, portanto, que Jesus nasceu em Belém e cresceu em Nazaré.
  1. O nascimento de Jesus
E, quando eles ali (em Belém) se encontravam, completaram-se os dias de ela dar à luz e teve o seu filho primogénito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria” (Lc 2,6-7).
Não havia lugar… para Aquele para quem todas as coisas foram criadas (cf. Cl 1,16). Faz parte do tornar-se cristão este sair do âmbito daquilo que todos pensam e querem, sair dos critérios predominantes para entrar na luz da verdade.
Maria colocou o Menino recém-nascido numa manjedoura (cf. Lc 2,7). O menino rigidamente envolvido nos panos aparece como uma alusão antecipada à hora da sua morte (em que é envolvido em panos…). A manjedoura é o lugar onde os animais encontram o seu alimento. Agora, porém, jaz na manjedoura Aquele que havia de apresentar-se a si mesmo como o verdadeiro pão descido dos céus, como verdadeiro alimento que o homem necessita para ser pessoa humana. Aqueles dois animais (boi e burro) podem ser vistos como os dois querubins que, segundo Ex 25,18-20, estavam colocados sobre a cobertura da Arca da Aliança, para indicar e esconder a presença misteriosa de Deus, escondem a Arca da Aliança; estes dois animais representam também a humanidade desprovida de compreensão (compreender que aquele menino era Deus).
Maria teve o seu filho primogénito… a teologia Paulina nos ajuda a ver o termo primogénito sob ponto de vista da salvação: Jesus não é só primeiro em ordem de dignidade, mas é Aquele que inaugura uma nova humanidade (cf. Rm 8,29); Ele é a primeira ideia de Deus e antecede toda a criatura, que está ordenada para Ele e a partir d’Ele (cf. Col 1,15.18).
Os anjos apareceram aos pastores… as primeiras testemunhas do grande acontecimento são os pastores que aí estão de vigia. Jesus nasceu fora da cidade, num ambiente de pastagens para onde levavam os seus rebanhos, eles portanto, estavam mais perto do acontecimento por um lado, e por outro lado eles estavam intimamente próximos de Deus, eles eram os pobres de Israel, às almas simples, os pobres em geral, destinatários privilegiados do amor de Deus (cf. Lc 10,21-22). Também a uma alusão à unção de David: quando Samuel foi enviado à casa do pai de David, todos irmãos de David que estavam na casa não foram escolhidos por Deus, somente David que estava fora, a apascentar o rebanho (Cf. 1 Sm 16,1-13). Em última análise Jesus nasceu entre os pastores porque Ele é o grande Pastor dos homens (cf. 1 Pd 2,25; Hb 13,20; Mq 5,1-3)
Sobre o anúncio aos pastores feito pelos anjos: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade”: da primeira parte entende-se que a glória de Deus não é algo que os homens podem produzir (contudo a nós cabe nos empenhar para que a glória de Deus não seja desonrada nem deturpada); da segunda parte, existem várias traduções, entre elas: “homens da sua graça” (há pessoas que não gozam do favor de Deus?); “homens por Ele amados” (existe algum homem que Deus não ame?). A tradução literal aponta para “homens do (seu) agrado (quais então são estes homens?). Em primeiro lugar é o próprio Cristo (Lc 3,22) e as pessoas do agrado de Deus são aquelas que têm o comportamento do Filho, pessoas configuradas com Cristo (a graça de Deus sempre nos precede, sustenta e alimenta). Lucas nos diz aqui que aquilo que o imperador Augusto pretendeu para si se realiza de modo mais sublime no menino: a paz de Cristo supera a paz de Augusto. A paz de Jesus é uma paz que o mundo não pode dar (cf. Jo 14,27).
Os pastores foram apressadamente… movidos talvez pela curiosidade humana, mas também sentiam-se cheios de ardor devido à alegria devido as coisas de Deus: o nascimento do verdadeiro salvador. E quantos cristãos se apressam hoje quando se trata das coisas de Deus?
  1. A apresentação de Jesus no Templo
Lucas fala do 8º e 40º dia: no 8º dia Jesus é circuncidado e no 40º acontece 3 coisas: a purificação de Maria, o resgate do filho primogénito através do sacrifico prescrito na Lei e a apresentação de Jesus no Templo. Maria ofereceu o sacrifício dos pobres (Lc 2,24), nos leva a pensar que Jesus se contava entre os pobres de Israel. Maria não precisou ser purificada porque esse nascimento trouxe a purificação do mundo, mas ela obedece à Lei. O menino não foi resgatado nem voltou à propriedade dos pais, mas foi entregue ao Templo pessoalmente a Deus, totalmente dado a Ele em propriedade. Os profetas Simeão e Ana aparecem como representantes de Israel crente. As palavras com que Simeão louva Deus “os meus olhos virão a (tua) salvação…”, soam “salvador”; depois disso ele se dirige a Maria e anuncia-lhe uma espécie de profecia da cruz (cf. Lc 2,34-35). A propósito do menino Simeão diz que ele será ocasião de queda e ressurgimento em alusão a Is 8,14 em que Deus é indicado como pedra em que se tropeça e cai: Deus com sua verdade opõe-se a múltipla mentira do homem, ao seu egoísmo e a sua soberba. Ana era uma viúva piedosa, de corpo e alma vivia junto de Deus e para Deus; a sua profecia consiste no anúncio, na transmissão da esperança de que vive.





CAPÍTULO IV: OS MAGOS DO ORIENTE E A FUGA PARA O EGIPTO
  1. Quadro histórico e geográfico da narração
“Tendo Jesus nascido em Belém da Judeia, no tempo do rei Herodes, chegaram a Jerusalém uns magos (astrólogos) vindos do Oriente. E perguntaram: Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (Mt 2,1-2).
Os paralelismos de Augusto voltam a aparecer em Herodes: ele que reina graças a protecção do governador e faz isso com pretensão messiânica. A profecia de Balaão, um vidente pagão, que encontramos em Nm 24,17: “Eu vejo, mas não para já; contemplo-o, mas ainda não próximo: uma estrela surge de Jacob e um ceptro se ergue de Israel”, poderia estar a circular fora do judaísmo e poderia ser objecto de reflexão para as pessoas num caminho de busca.
  1. Quem eram os magos?
Eram membros de uma casta sacerdotal persa (dirigentes de uma religião, com ideias religiosas fortemente influenciadas pelo pensamento filosófico); detentores e profissionais de um saber e de um poder sobrenaturais (feiticeiro, sedutor). Os magos que Mt 2 apresenta embora não pertencessem exactamente a classe sacerdotal persa, eram portadores de um conhecimento religioso e filosófico que se desenvolvera e se achava ainda presente naqueles ambientes. Mas que género de homens eles eram? Provavelmente não eram apenas astrónomos, mas homens de uma certa inquietação interior, homens de esperança, à procura da verdadeira Estrela da salvação; eles eram sábios que iam pata além de si mesmo a busca de Deus. Eles representam o caminho das religiões para Cristo, bem como a auto-superação da ciência rumo a Ele: o movimento das religiões e da razão humana ao encontro de Cristo. Eles representam o encaminhamento da humanidade para Cristo, inauguram uma procissão que percorre a história inteira.
  1. A estrela
Várias são as teorias sobre a estrela de Belém, sendo que uma apontam para a estrela como um fenómeno astronómico e outros (como é o caso de Crisóstomo) diz que não se tratava duma estrela comum, mas um poder invisível que adoptara tal fisionomia. Ora, a grande conjunção de Júpiter e Saturno (o fenómeno da estrela muito brilhante) no signo zodiacal de Peixes nos anos 7-6 a.C (ano provável do nascimento de Cristo) parece ser um facto confirmado.
A linguagem da criação suscita no homem a intuição do Criador, suscita a esperança de que um dia esse Deus se manifestará e suscita a consciência que o homem deverá ir ao encontro d’Ele. Na verdade a estrela conduziu os magos até a Judeia mas só pelas Sagradas Escrituras de Israel (Mt 2,6; Mq 5,1; 2 Sm 5,2) é que eles encontraram a estrada para o verdadeiro herdeiro de David. Um dos Padres (Gregório Nazianzeno) diz que no momento em que os magos se prostraram diante de Jesus, terá chegado o fim da astrologia. Nesta ordem de ideia percebe-se que não é a estrela que determina o destino do menino, mas o menino que guia a estrela.
  1. Paragem intermédia em Jerusalém
Os magos procuram pelo “rei dos judeus”, uma linguagem não judaica porque o comum era “rei de Israel”; “rei dos judeus” volta a aparecer no processo de Jesus e na inscrição da Cruz, usada em ambos casos por um pagão, Pilatos (cf. Mc 15,9; Jo 19,19-22), o que significa que no momento em que os primeiros pagãos perguntam por Jesus já transparece o mistério da cruz, indivisivelmente ligado à realeza de Jesus. Ouvido isso Herodes e toda Jerusalém ficaram perturbados, pois aquilo que na grande perspectiva da fé é uma estrela de esperança, na perspectiva da vida quotidiana constitui, inicialmente, apenas causa de transtorno, motivo de preocupação e temor. É que Deus perturba a nossa comodidade diária.
  1. A adoração dos magos diante de Jesus
A estrela que os magos seguiam desapareceu em Jerusalém, só depois do encontro dos magos com a Palavra da Escritura, a estrela resplandece de novo para eles. A criação, interpretada pela Escritura, volta a falar ao homem. Ao ver a estrela sentiram fortemente uma grandíssima alegria (Mt 2,10). É a alegria do homem que é atingido no coração pela luz de Deus e pode ver realizada a sua esperança: a alegria daquele que encontrou e foi encontrado. Os magos prostram-se diante d’Ele; esta é a homenagem que se presta a um Rei-Deus; e oferecem presentes: em Is 60,6 o ouro e incenso são presentes que hão-de ser oferecidos pelos povos ao Deus de Israel. O ouro mostra a realeza, o incenso aponta para sua filiação divina, e a mirra para o mistério da sua Paixão (em Jo 19,39 diz-se que Nicodemos trouxe mirra para ungir o corpo de Jesus), assim o mistério da cruz ligado a realeza prenuncia-se já na adoração pagã.
  1. A fuga para o Egipto e o regresso à Terra Santa
Em sonhos José é informado pelo anjo para fugir para o Egipto com o menino e mãe, pois Herodes procurará o menino para o matar (Mt 2,13). Estava em jogo o reinado de Herodes, ele sentia-se ameaçado, estava disposto a matar quem fosse uma ameaça (Jesus), como os magos não voltaram, ele decidiu matar os meninos recém-nascidos da idade de dois anos para baixo. Alguns exegetas questionam a realidade histórica do acontecimento. Alguns dizem que tal narrativa teve influência de uma literatura daquele tempo aplicada a Moisés, que podemos encontrar no hagadá de Moisés transmitida por Flávio Josefo: segundo o livro de Êxodo, faraó estava preocupado com o aumento da população israelitas, via nisso uma ameaça para seu país, por isso mandou matar os filhos recém-nascidos de sexo masculino, e Moisés acaba escapando, e é criado na corte como filho adoptivo da filha do faraó; mais tarde devido ao compromisso a favor da população judaica atribulada, tem de fugir (cf. Ex 2). No hagadá de Moisés conta de outra maneira: o faraó ouviu que nasceria da raça judaica um menino que uma vez adulto destruiria o domínio dos egípcios e tornar os israelitas poderosos. Em resultado disso o rei ordenou que fossem mortos todos meninos judeus logo depois do nascimento, lançando-os ao rio. Mas Deus apareceu ao pai de Moisés e prometeu salvar o menino. Esta história faz com se pense na narrativa de Mateus como uma variação cristã da hagadá de Moisés, mas sabe-se que existem grandes diferenças e por outro lado o livro de Flávio é posterior ao Evangelho de Mateus. Entretanto Mateus retomou a história de Moisés como os olhos postos em Os 11,1: “do Egipto chamei o meu filho”. Filho antes aplicado a Israel e agora aplicado a Jesus. Ora o primeiro chamamento para regressar do país da escravidão tinha falhado sob muitos aspectos: “quanto mais os chamei, mais se afastaram” (Os 11,2); este afastamento conduz o povo a uma nova escravidão: “ele voltará ao Egipto, e a Assíria será seu rei, porque recusaram converter-se” (Os 11,5). Por assim dizer Israel continuava a estar no Egipto. Para o Evangelista a história de Israel recomeça de modo novo com o regresso de Jesus do Egipto à Terra Santa: Jesus opera o êxodo definitivo, Ele não sai de casa para se afastar do Pai, Ele volta a casa e conduz a casa; Ele, o verdadeiro Filho, saiu para o “exílio” a fim de nos trazer a todos da alienação para casa. Finalmente a consolação pelos meninos mortos, não são simples palavras de consolação, mas a ressurreição. Mais uma vez José avisado em sonho, toma o menino e a mãe de volta, mas desta vez não em Belém, pois ouvem que Arquelau rei mais cruel dos filhos de Herodes, reinava na Judeia; ele deverão ir fixar-se na Galileia. É o anjo que os manda para a Galileia para mostrar que a proveniência de Jesus da Galileia concorda com a orientação divina da história. Jesus vai morar em Nazaré, de tal modo que entre os hebreus os seguidores de Jesus eram chamados nazoreus. Na palavra nazoreu, ressoa a palavra nezer patente em Is 11,1: “brotará um rebento (nezer) do tronco de Jessé (pai de David)”, dai o cumprimento da profecia segundo a qual do tronco de Jessé saira um novo rebento sobre o qual repousaria o Espírito de Deus. Assim na cruz “Nazoreu” não só designa a proveniência de Jesus mas também a sua identidade profunda (Ele é o rebento consagrado a Deus).
E qual deve ser nossa atitude? Para Klaus Berger “mesmo no caso de um único testemunho…, é preciso supor, até prova em contrário, que os evangelistas não têm a intenção de enganar os seus leitores, mas querem contar factos históricos (…) contestar por mera suspeita a historicidade desta narrativa ultrapassa toda a competência imaginável de historiadores que se possa imaginar.

EPÍLOGO: JESUS AOS 12 ANOS NO TEMPLO

O facto de Maria e Jesus (juntamente com José) terem participado na peregrinação (a Jerusalém) prova uma vez mais a religiosidade da família de Jesus. Foi a 1ª Páscoa de Jesus em Jerusalém, apesar de ser obrigatória a partir dos 13 anos, ao faze-lo aos tinha em vista a aquisição do hábito pouco a pouco. Contudo de regresso Maria e José, já no final do dia dão-se conta da sua ausência. De facto o adolescente de 12 anos era deixado livre para decidir juntar-se aos coetâneos e amigos e ficar na sua companhia ao longo do caminho, mas à noite, esperavam-no os pais. O facto de Jesus não se apresentar não tem nada a ver com a liberdade dos jovens, remetendo antes, como se verá, a outro nível: a missão particular do Filho.
Os três dias que levaram a procurá-lo podem ser visto como uma alusão velada aos três dias entre a cruz e a ressurreição. São dias de sofrimento por causa da ausência de Jesus, dias de uma escuridão cuja gravidade se sente nas palavras da mãe (Lc 2,48). A resposta que Jesus dá é simplesmente: estou precisamente onde é meu lugar, com o Pai, na sua casa. Torna-se claro que aquilo que parecia como desobediência ou liberdade inconveniente com os pais, na realidade, é precisamente expressão da sua obediência filial: Ele está no Templo não como desobediência mas como aquele que obedece. Maria não entende mas guarda a resposta de Jesus no seu coração, ele tem que amadurecer a sua fé: as palavras de Jesus nunca cessam de ser maiores do que a nossa razão, superam sempre de novo a nossa inteligência; é uma tentação compreensível reduzi-las e manipular para fazê-las entrar na nossa medida, contudo uma recta exegese é feita na humildade que respeita esta grandeza.
Crescer em graça ressoa a infância de Samuel que também crescia em graça diante de Deus e dos homens; o evangelista recorre a uma correlação entre a história da infância de Jesus e Samuel, correlação que apareceu pela primeira vez no Magnificat, o cântico de louvor de Maria por ocasião do encontro com Isabel, um hino que é uma nova versão da oração de gratidão de Ana, mãe de Samuel.
Esta narração sobre Jesus aos 12 anos abre a porta para o conjunto da sua figura que depois nos é narrada pelos Evangelhos.